domingo, 3 de janeiro de 2010

MIB: Música Impopular Brasileira #1

“Porquê impopular?” é a primeira pergunta que vem à cabeça quando se lê o título com que batizei essa pequena intervenção musical que, em meio a tanta literatura, passo a inserir. É que sempre me incomodou o fato de certas músicas primorosas passarem despercebidas pelo público, mesmo dentro de um segmento mais antenado com a arte. Felizmente, a internet tem possibilitado cada vez mais o acesso a essa fortuna cultural negligenciada em duas frentes opostas: de um lado, pela ação de sites que disponibilizam acervos de LPs não digitalizados (muitas vezes fruto de acervos pessoais) e, de outro, pela facilidade com que temos acesso à produção recente e que não encontra espaço na mídia convencional, tendo sua obra divulgada via canais de relacionamento como MySpace ou YouTube ou – mais raro – por iniciativas ousadas e originais, como esta da Trama.

Além do mais, música e literatura são irmãs. Assim o sinto, e assim tem-se visto e registrado ao longo de séculos, dos trovadores ao Chico Buarque. Permitam assim, esta licença poética.
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VALSA DA SOLIDÃO

Sendo bem honesto: a única informação que encontrei na net a respeito dessa canção na net, eu já sabia. Ela é produto da parceria de Paulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho, dado que consta no encarte do primeiro álbum de Roberta Sá, Braseiro. Isso por si só já demonstra a “impopularidade” da música e sua legitimidade neste espaço. E que presença bem-vinda! Este maná chegou a nós pelo violão de Rodrigo Campello (que também cuidou do arranjo), pelo piano eletrônico de Marcos Nimrichter, pelo cello de Hugo Pilger e a voz indescritivelmente sedutora de Roberta.

Do início ao fim, a valsa é sutileza: a vassoura varre o prato, abrindo caminho para o Fender Rhodes que embala a voz de Roberta, em ornamentações sobre acordes de sétima e décima terceira. Toda a trama de dúvidas e hesitações de que a letra nos fala é então amparada pela chegada de um decidido violoncelo. É como se o arranjador nos apresentasse aqui o personagem masculino, origem de todo o abandono de que ela é vítima. Sabe quando colocamos a mão sobre a água, o suficiente apenas para sentir a sua superfície? Ali, naquele limite, é onde se encontram esses sons que mexeram tanto comigo.

Ouvi a versão gravada por Elizeth Cardoso e não titubeio: sou mais essa.

Até a próxima e a todos o meu desejo de que 2010 seja repletos das melhores músicas e leituras.

2 comentários:

Amanda Azis Alexandre disse...

Que legal esse seu comentário! Gosto muito da Roberta Sá e minha música preferida do Braseiro é Lavoura. Mas, graças a vc, ouvi Valsa da Solidão com mais atenção e realmente é linda! Vc disse que a entrada do violoncelo pode representar a presença masculina... eu concordo e digo mais... a presença masculina somada a um toque fúnebre. O violoncelo me remete a isso... entranhas remexidas... na música "vontade de morrer de amor".
To viajando muito? rs
bjoka e obrigada

Fernando Ribeiro disse...

É... tem esse quê de fúnebre sim... acho que a solidão às vezes pode soar como elegia. Principalmente se a gente é abandonado, como acontece na música. Obrigado por mais essa visita! Beijo!